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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

menina de tranças




Houve um tempo no qual eu vivia num mundo mágico. Era um mundo encantado, onde não havia problemas, tristezas e as dores, eram só as dos joelhos e cotovelos ralados. Não havia egoísmo, não havia inveja, intrigas, fofocas, maldades, cinismo, maledicências, mentiras, ciúmes e ódio. Esses são sentimentos baixos que habitam apenas o coração dos adultos. Nesse mundo mágico eu era feliz.

Nesse tempo, os sentimentos que me cercavam era o companheirismo, a camaradagem, o respeito, a amizade, o altruísmo, a caridade, o amor, a parceria, o bom senso, a virtude, a ética, a verdade e a moral. O "eu" não era tão importante. Importante era o "nós". Todos esses sentimento perderam sentido e a força, no mundo atual. Eu era inocente !

Não que eu fosse alienada. Eu sabia que a fada Sininho, o coelho da Páscoa, o Papai Noel e a cegonha eram seres que povoavam e encantavam o imaginário infantil. Eu sabia diferenciar o mundo irreal do mundo real. Mesmo assim, vivendo entre dois mundos, eu era feliz. Eu era dona do mundo.

Meu grande erro foi crescer ! Não consegui evitar que o mundo continuasse a girar. O tempo não parava de passar.
O tempo passava e ia modificando meu mundo e ao mesmo tempo, fazia meu corpo passar por transformações. Eu sentia as mudanças e nem todas eu compreendia, mas mesmo assim, eu era feliz. Continuava achando que era a dona do mundo.

A vida tinha mais coisas a me ensinar. Nem sempre ela foi uma mestre bondosa, às vezes, era bem dura e ríspida. A primeira atitude da vida foi me tirar do meu mundo encantado - Itatiaia - meu pai foi transferido para São Paulo.

Jamais vou esquecer o instante que descemos na rodoviária e o impacto que a cidade causou na família. Meu pai era um cidadão do mundo, a cidade não mexeu com ele. Minha mãe, embora já houvesse morado em outra capital - Florianópolis - não estava preparada para enfrentar São Paulo. Ficou com medo e insegura. Apavorada seria o termo mais certo. Nos colocou junto a ela e não nos deixava em paz, tentando nos apavorar. Ela tentava nos controlar através do medo. Dizia que uns ciganos apareceriam e iriam nos raptar. Talvez tenha sido com ela que aprendi a detestar ciganos. Não consigo vencer o pavor que tenho deles, mesmo hoje, quando já raciocino com mais lógica.

Mas eu amei São Paulo. Me apaixonei. Foi amor a primeira vista ! Tinha certeza que era ali que queria viver, para sempre. A vida me levou para São Paulo, apenas, para me dar mais uma lição - humildade.

Fomos morar no Tucuruvi, desconfio que é ou era um bairro operário, ouvia muitas sirenes de fábricas. Eu nem sabia o que era uma fábrica, a primeira vez que ouvi o som, pensei que fossem navios. Navio eu conhecia. Fomos estudar numa escola pública e eu enfrentei uma nova realidade. Um mundo mais duro, precisei me adaptar.

Chego na escola, cabelos trançados e enormes laçarotes nas pontas. Passei vergonha. Nenhuma menina usava, fui motivo de piada e é claro, os meninos puxavam minhas tranças. O grupo me intimidou. Eles se comportavam de forma totalmente diferente de tudo o que eu conhecia. Eles usavam uma linguagem completamente diferente da minha. Foi um sofrimento só. Fiquei intimidada mas não com medo.

Quando contei que era gaúcha, mais piadas. Perguntavam se andávamos de vestidos longos e os homens de botas e bombachas. Quando contei das minhas brincadeiras de subir em árvores, comer goiaba no pé, tomar banho de rio, subir morros, caçar sapos, rãs e passarinhos, me olharam como se eu fosse uma criatura da época das cavernas. As meninas eram piores. Elas riam e debochavam. Os meninos até que se interessavam. Gostavam de ouvir. Nesse momento tive a noção exata de que eu não passava de uma caipira. Não era dona do mundo ! O meu mundo até então, era formado apenas de pequenas e modestas cidades do interior. Eu não era poderosa, eu tinha muito o que aprender. Eu precisava aprender para sobreviver.

Aprender a falar e pensar como os paulistas foi fácil, difícil foi aprender a lidar com as meninas. Descobri a falsidade do universo feminino. Como eu precisava observar para aprender, comecei a ouvir mais e a falar menos. O dia que um menino disse que eu era a mais bonita na sala, descobri o ciúmes , a inveja, a maledicência, a competição por tolices, por coisas medíocres. Virei alvo de um grupo que se considerava o melhor da sala.

Naturalmente me aproximei das mais fracas e consegui fazer "amizade". Percebi que não havia sinceridade, lealdade nem dentro dos grupos. As poderosas sempre criticavam membros do próprio grupo , quando as meninas não estavam presente. No meu grupo, as fracas, havia as invejosas, aquelas que irão passar a vida inteira rastejando, que desejavam ser aceitas pelas poderosas. Faziam conversa ,espalhavam fofocas, mentiam a nosso respeito, esperavam mudar de status. Continuavam fracas, não eram aceitas no outro grupo e ainda por cima, eram usadas. Até os deveres de casa elas faziam para as poderosas.

Meu desencanto com o mundo feminino foi total. A minha experiência com meninas era com minhas colegas de aula, só as encontrava na escola e quase nem nos falávamos. Havia minha irmã, ela era doce e meiga, raramente participava das minhas aventuras. Havia minha mãe e as professoras, essas não contavam, eram autoritárias e eu sempre detestei autoridade. Como foi difícil me adaptar !

Eu continuava a usar as malditas tranças. Um dia resolvi dar um basta as tranças, cheguei na escola, desmanchei as tranças. Criei novo problema para mim. Meus cabelos eram bonitos e bem cuidados (por minha mãe), despertei a inveja das meninas e a admiração dos meninos. Um menino inventou que era meu namorado. Eu nem sabia o que era um namorado, mas sabia que não era boa coisa. Já tinha escutado a palavra "namorado" nas conversas das mães. Elas criticando a filha de alguém que estava namorando. Todas concordavam que se fosse com a filha delas, levaria uma surra para não esquecer tão cedo. Eu não queria tal surra. Esse assunto de "namorado" jamais chegou aos ouvidos da minha mãe! Felizmente. Quanto as minhas tranças, consegui convencer minha mãe a não usar mais, usava o que chamávamos "rabo de cavalo", como a maioria das minhas colegas.

Moramos pouco tempo em São Paulo, minha mãe não se adaptou, vivia com medo. Ela tinha medo de tudo. Voltamos para Itatiaia. Mas nunca mais foi a mesma coisa. Perdi meu mundo encantado. Eu não era mais a mesma, havia crescido. O mundo agora, era visto com olhos diferentes. Já não era tão feliz, descobri a perfídia.

Essa passagem por São Paulo, mudou minha vida para sempre. Conheci a maldade escondida no coração humano e jamais voltei a confiar nas mulheres. Ao longo da vida, consegui poucas e boas amigas mas aprendi que ser boa, ser leal, não é a regra e sim a exceção. Lamentável !

Aquele grupo de meninas paulistas me auxiliaram a perceber que sempre há alguém mais esperto e mais inteligente do que você. Aquele comportamento dos dois grupos, sempre se repetiram em grupos diferentes, ao longo da minha vida. Não consegui mais respeitar as mulheres e muito menos desejar ser amiga delas. Continuei a preferir ser amiga dos meninos, é muito mais fácil, mesmo quando eles tentam "passar uma cantada" em você.

"Experiência é o nome que nós damos aos nossos próprios erros", de acordo com Oscar Wilde,eu aprendi com meus erros. Não pense que eu odeio as mulheres, nada disso, eu apenas fico longe delas. Eu tenho irmãs e sobrinhas que eu amo, somos amigas.Tenho uma filha, eu deveria estar muito inspirada no momento que a concebi, ela é linda, linda mesmo ,tanto por dentro como por fora, quem a conhece sabe que não é vaidade de mãe. É minha melhor amiga. Meu filho é lindo também e meu amigo, só que estou falando sobre mulheres.

Este post é minha resposta a uma "mulher" que mandou um e-mail, dizendo que sou "sapatão", pois só brincava com meninos. Que nada, eu não tinha era opção. Primeiro não sou sapatão, calço 37, segundo sem a menor chance de ser lésbica ! Nada contra elas, não tenho o hábito de criticar as pessoas. Vou te contar um segredo "amiga" - sou gay - gosto de homens.

Continuo amando São Paulo, meu sonho de consumo. Minha música hoje é para homenagear essa cidade, pelo seu aniversário.

A imagem é uma obra de Cândido Portinari

Alguém lembra dessa música? Anos 80 , eu adoro.

Café?


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