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sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

inquietude



Ou você cria asas e voa ou vai passar a vida toda se perguntando como é ver a terra lá do alto. Eu sempre arrisquei e fui em frente. Há algo dentro de mim que não me permite parar. Mesmo que eu não queira sou impulsionada a ir em frente. Esse "algo" parece uma voz sussurrando nos meus ouvidos- vá em frente. Se ouço vozes serei esquizofrênica? Não, não sou! Eu disse “que apenas que parece uma voz”. Poderia ficar sentada apenas observando o mundo. Gosto de observar mas acho essencial participar. Aí começam meus problemas.

Como participar se não me interesso mais pelas pessoas? De modo geral são todas previsíveis e isso me cansa. Gosto do imprevisto. Não preciso saber tudo, preciso descobrir coisas novas. Adoro chegar cedo ao aeroporto só para ficar observando as pessoas. O que mais gosto nelas é que não as conheço, então, posso criar uma vida diferente para cada uma. Nessa vida que "crio" para cada uma, são todas interessantes. Falam sobre seus mundos diferentes, sobre suas viagens, suas leituras, emoções, frustrações, enfim, sobre coisas que me interessam.

Não há nada mais frustrante do que conversar com uma pessoa que esteve em São Paulo, Buenos Aires ou Paris e elas falarem apenas sobre restaurantes, compras, lugares elegantes que foram, coisas engraçadas que viram e voltam para os restaurantes e a saudade que sentiram do feijão com arroz de todo dia. Eu gosto também de voltar para casa, para o conforto do meu ninho, mas não sinto saudade. O meu espírito quer mais! Eu aprecio lugares e restaurantes sofisticados, no entanto, não são minhas prioridades. Elas me aborrecem citando todos os itens que adquiriram, comparam preços, valor das moedas. Eu fico quieta ouvindo (na verdade fingindo que estou ouvindo) pacientemente e concordando comigo mesma - perda de tempo irrecuperável - o tempo perdido não volta mais e nem se recupera. Vontade de mandá-las para a 25 de março! Eu sou uma pessoa que sequer olha vitrines. Não gosto, não me interessam e não tenho paciência.

Há dias que meu espírito extrapola os limites do meu corpo, então fica espremido dentro dele e isso me causa agonia, inquietude, sensação de ter tido as asas cortadas e nunca mais poder voar. Sinto o desejo insuportável de me libertar. Esse meu "me libertar" inclui as pessoas. Se eu me afastar, totalmente, delas ficarei isolada, presa numa ilha sem esperança de ser resgatada. Não tenho medo da solidão, nunca me sinto só, o meu mundo interior já é bem povoado com meus sonhos. Há um lado positivo na solidão, ela propicia o meu encontro comigo mesma. Nesse momento sou eu mesma, in natura. Eu não sou uma ilha, gosto de me ver como um arquipélago sobre o qual meu espírito sobrevoa. Então qual seria o motivo das pessoas estarem me aborrecendo hoje? Sempre sinto falta de uma certa competência para mentir, ajudaria e muito!

Hoje estou inquieta, quero algo que não sei o que é. Quando me sinto assim preciso me isolar, ficar quieta, me ocupar com algo que prenda minha atenção. Mas não encontro. Quero voar, mas minhas asas pesam, parecem de chumbo. Estou acorrentada, como Prometeu, mas felizmente não pela eternidade, eu espero. Hoje não consigo decolar, ver o mundo lá de cima, ter um novo ponto de vista e em total segurança. A música, que sempre me acalma está me irritando.

Raramente fico zangada comigo por ter uma alma tão inquieta e errante. Levar a vida tão à sério é um erro, precisamos rir com piadas idiotas, conversar sobre futilidades, criticar o governo e não fazer nada (só a crítica pela crítica), falar sobre compras inúteis, olhar fotos e mais fotos dos amigos, dos conhecidos, da família e achar todas lindas (mesmo não sendo), coisinhas banais assim, porém normais, no dia a dia de todos. Não consigo! Estou sempre voando contra a corrente do ar. Quando estou assim, preciso me isolar, para minha própria segurança. Se normalmente já preciso manter meus pensamentos numa coleira, neste estado posso soltá-los e seria mal compreendida. Nem seria justo com os outros. Iria contrariar o que estou sempre afirmando e defendendo - o direito dos outros pensarem diferente de mim. Não existem critérios ou padrões de avaliação para dizer quem está certo ou errado. Nem sempre acho que estou certa.

Hoje eu queria voar, ir em frente e não estou conseguindo, até a porta do meu mundo de sonhos está fechada.

Café?



terça-feira, 13 de novembro de 2012

dormir de conchinha.




Não me fascina esse mundo moderno e toda sua tecnologia. Ela apenas afasta as pessoas que passam a viver num mundo ilusório onde tudo é possível, mas nada é real. Falo especificamente das redes sociais. Logo que criei meu blog, uns meninos perdidos me encontraram por aqui. Se apaixonaram pela imagem da moça sonhadora do blog e me deram bastante trabalho.

O mais interessante neles, que dentro do delírio de cada um, eram sinceros. Mandavam e-mail profissional, todos com ótimos empregos, boa aparência, curso superior. Um adulto profissional mas uma criança imatura emocionalmente. Eu não conseguia entendê-los. Não havia a menor lógica, do meu ponto de vista, no comportamento deles. Como eram educados e gentis, eu apenas ralhava com eles e dava conselhos. Eles, absurdamente, não acreditavam que eu poderia ser mãe deles. Entendi, finalmente, que não queriam que a verdade fosse verdade. Eles queriam a ilusão. Loucura total! Inexplicável para mim, naquele tempo.

Hoje, eu compreendo aqueles meninos. Eles sofriam de um problema que a meu ver, afeta a população - uma séria carência afetiva. É impressionante observar que essa carência não é prioridade das pessoas mais idosas, ela se instala em todas as idades, independente de estado civil também. O amor, definitivamente, não é mais eterno nem mesmo enquanto dure.

No facebook, acompanho os amores e os desamores das pessoas.  Ele funciona como o divã de um analista para muitos. Vejo declarações de amor eterno, tão intensas e fortes, que eu fico condoída pelo sofrimento daquela alma, quando o "amor" mostrar a verdadeira face. Se eu amo alguém profundamente, intensamente, preciso gritar para o mundo? Será que não acordarei as divindades da inveja e do ciúme? Fico até supersticiosa, silenciosamente, bato três vezes na madeira, por aquela criatura inconsequente. Eu não quero vê-la desmoronar de dor, uivar para a lua ensandecida, se perder aquele amor e precisar mudar de status. É muito importante marcar o status no facebook - "em um relacionamento sério", esse status, numa segunda-feira qualquer, pode mudar para "solteiro (a)" Nesse caso haverá choro e ranger de dentes até encontrar um novo amor ou reatar com o antigo mesmo. As mulheres reclamam da inconstância e infidelidade dos homens, da falta de compromisso e seriedade deles. Eles reclamam usando palavras mais fortes ainda. Um dia desses, li uma frase que me chocou - "O amor está difícil e as mulheres mais ainda, mais fácil ser gay, pelo menos vou ter com quem conversar sobre futebol, pelo menos" Olha o desencanto do moço que já estava até pensando em mudar a sua opção sexual para não se sentir sozinho. Entristeceu-me o desencanto, a carência afetiva e a solidão dele. O que será que as pessoas entendem por amor, hoje em dia? Até o "eu te amo", que no meu tempo era coisa séria, hoje, é banal. Como um "bom dia" qualquer.

Tudo bem sou saudosista mesmo! Gostava do namoro antigo onde, passo a passo, se unia as peças do grande quebra cabeça que é a vida a dois. As peças eram unidas e coladas. Não se perdiam, não eram levadas por um vento qualquer. Quando se encontrava a pessoa certa, o maior sonho era dormir de conchinha, para sempre. Melhor que o sonho era acordar no dia seguinte e saber quem estava abraçado em você.

Todo esse devaneio foi causado por uma notícia que li no jornal. A novidade surgiu nos Estados Unidos, com certeza logo estará aqui, a mais nova profissão no mercado, Sabe qual é?  Cuddler Professional, numa tradução livre - uma chamegadora profissional. Lá, por aquelas bandas há pessoas pagando algo em torno de R$120,00, por hora, para ter afeto e ser acolhido, basicamente para dormir de conchinha. Essa foi a forma que uma moça arrumou para pagar seus estudos. Não há sexo, nem são permitidos toques íntimos. Os pagantes são proibidos de tocar nas partes do corpo cobertas com roupas e ela está sempre de pijama. Ela chega a dormir até com 60 pessoas por semana, incluindo mulheres, ou seja lá quem for que esteja carente.

De acordo com a psicóloga Sheyna Vasconcelos a "nossa sociedade exige que estejamos namorando ou casados, como se isso fosse garantia de plenitude afetiva." Para a profissional, "as redes sociais também exacerbam a carência afetiva. Nessas redes, todo mudo é muito feliz, se diverte muito, tem muitos amigos, muitos programas e se as pessoas não estão nesse grupo ou não vive esta mesma situação se sente excluída e, consequentemente, mais carente".

Que mundo terrível! Eu vivi num mundo, onde felizmente, não precisava pagar por afeto e dormia de conchinha com o homem que escolhi, na nossa cama. 

Café?

domingo, 4 de novembro de 2012

hoje é domingo






Estou voltando para o blog após longa temporada ausente.  Primeiro, por algum problema técnico qualquer, eu não conseguia acessá-lo. Tentei trocar a senha e nada funcionava. Finalmente perdi o interesse. Arrumei uma nova distração, fui jogar no Facebook, aquele mesmo que eu havia criticado bastante.

O jogo começa a me entediar, sem emoção alguma. O Facebook continua sendo um lugar de muitas tolices tipo: "partiu para o banho, para o shopping, para o cinema" e assim por diante. Há coisas piores ainda, é possível constatar que os alunos de ensino médio, universitários e até formandos e formados, não sabem escrever. Não estou falando do "naum" no lugar de não. Leio coisas engraçadas como "agente" quando deveria ser "a gente", "concerteza" tudo juntinho e o sucesso entre a moçada - nada há ver! Para onde foi o nosso bom português? Se não me instrui pelo menos me diverte. Nada a ver não é?  Piadinha de humor negro.

Esse tal de face, no entanto, tem lá seu lado bom, encontrei parentes que nem sabia que existiam. Jogando, conheci pessoas não só do Brasil como do exterior também, nesse exterior incluo aquele povo lá do Oriente Médio. Não entendia nada do que me diziam e nem sei fazer aqueles risquinhos que são as letras deles. Não pensem que o tradutor oferecido funciona. Se o tal tradutor é péssimo em inglês posso imaginar o que ele traduz em árabe. No começo até tinha medo deles, vá que eu esteja jogando com um terrorista! Vá que aqueles rabiscos sejam apenas um disfarce para troca de mensagens entre eles. Vá que qualquer hora dessas apareça alguém do Mossad, Interpol, MI5 ou até mesmo o James Bond na minha porta, confiscando meu notebook. Ando assistindo filme de espionagem americano demais. Brincadeiras à parte, eles são excelentes parceiros de jogo, sempre colaboram, diferentes dos brasileiros, oportunistas, mais pedem do que retribuem. Enfim (não em fim) jogo é jogo e trapaça faz parte.
Jogando no face, por incrível que pareça encontrei pessoas maravilhosas. Formamos um grupo e nos ajudamos mutuamente. Nossa amizade foi além da ajuda nos jogos, conversamos e nos sentimos tão à vontade uns com os outros, que parece que somos amigos de infância.

O que tudo isso tem a ver com domingo? Domingo é a fantasia preferida, todos concordam que nesse dia sua vida vai mudar. Todos farão coisas muito divertidas, alegres que renderão conversa a semana toda, até o próximo domingo. Irão encontrar pessoas interessantes, sabe-se lá se não o homem ou a mulher ideal, pelo qual esperaram a vida toda. A partir de quinta-feira começam as postagens dando vivas para a sexta-feira. Depois dela vem o sábado e logo no dia seguinte, o tão sonhado domingo.

Na segunda-feira, acordam para a realidade. Nada aconteceu de interessante, não conheceram pessoas novas, passaram o domingo todo assistindo televisão, dormindo ou comendo. O mais emocionante do domingo foi o almoço rotineiro em família. Todos entediados e reclamando que no dia seguinte vem a segunda-feira. Nessa segunda-feira, recomeçam a sonhar com a mudança que poderá ocorrer no próximo domingo. O lado bom dessa fantasia é que talvez, para alguns, realmente ocorra um domingo brilhante. Quando o domingo for apenas o rotineiro, até que é bom. Pior para aqueles que terminam os namoros no domingo ou no sábado. Não tenho dados estatísticos que comprovem cientificamente essa minha afirmação, mas pelo que leio ninguém rompe relação na segunda. A segunda de cada um desses pode significar o início da busca por um novo amor, diferente do anterior ou o início do calvário na vã tentativa de buscar a resposta para a inevitável pergunta - "onde foi que eu errei?" Vai custar a entender ou nunca irá entender que em casos de amor erram sempre os dois lados. O que realmente nos sustenta no pós domingo é a esperança no próximo domingo. Que ele venha logo e cheio de coisas boas.
Bom estar de volta ao meu canto.


Café?














segunda-feira, 23 de abril de 2012

trago você no olhar


Olhos fechados pra te encontrar

Já disse várias vezes que o objetivo deste blog seria o de permitir que eu largasse as pedras que carregava, pelo caminho. Nunca foi minha intenção partilhar com ninguém. Acredito que estava mentindo, se não quisesse compartilhar, escreveria no papel e guardaria numa gaveta, fechada a sete chaves. Sempre achei estranho o comportamento dos seres humanos, como me incluo nesse grupo, faço parte desse grupo estranho, logo, tudo se justifica por si mesmo.

Hoje estou às vésperas do dia que mudou minha vida para sempre. Não estou triste. O sentimento é outro. È saudade, é pensar em borboletas, elas são tão efêmeras. Vivem tão pouco, porém encantam nossos olhos com sua beleza, com suas cores, com seu vôo elegante. Tudo muito suave, tão belo! Gosto desse mundo suave. Não consigo me adaptar a roda do tempo, ela é muito rápida. Parece que foi ontem que meu mundo desabou.

Não estou ao seu lado, mas posso sonhar

Nunca fui fraca e tão pouco medrosa. Sou guerreira! Após o terremoto, revirei os escombros, salvei o que era importante, removi os entulhos e comecei a reconstruir. Assim que precisa ser. Chorar sobre o caos não resolve nada. Não muda o momento em que tudo aconteceu. Não vou dizer que é fácil. Não se usa escavadeiras para remover os entulhos emocionais. Tem que ser com as mãos. Quebrar as unhas, sangrar os dedos e gemer de dor nas costas. Só nas costas não, no corpo todo. O que mais dói é o coração. O que dificulta são as lágrimas, elas nos cegam e nos fazem parar várias vezes para enxugá-las. Seria um trabalho para Hércules, porém, executado por uma borboleta. Mas eu consegui!

Aonde quer que eu vá, levo você no olhar.

Às vezes, a dor é tão grande que precisamos de um refúgio, um lugar seguro, protegido de abalos sísmicos emocionais. Eu me voltei para os sonhos, para a minha infância, período que fui feliz. Não que não tivesse sido feliz mais adiante, fui e muito, só que lá, eu desconhecia qualquer dor, alem das provocadas pelos joelhos ralados nas quedas. Esses, minha mãe curava. Essa regressão é escapismo e um paradoxo para quem se diz guerreira. Mas vem cá, não sou a Mulher Maravilha. Apenas uma mulher cheia de contradições. Ser adulto é muito difícil. Ser sensato, coerente e centrado, além de lógico, tudo ao mesmo tempo, não é fácil.

Aonde quer que eu vá, aonde quer que eu vá

Quando você tem um mundo perfeito, construído, pedra por pedra, com muito carinho e sem aviso prévio, ele implode, sobreviver é só para os fortes. Mais difícil ainda é se inserir no mundo dos chamados “normais”, daqueles que nem sabem o que é um amor de verdade.Que distribuem “eu te amo”, como se fosse “bom dia”. Daqueles que acreditam que um amor substitui o outro. Daqueles que não possuem a sensibilidade para compreender a dor da ausência. Das falas vazias, tipo: -“você tem seus filhos”. Eu não deveria ter raiva dessas pessoas, deveria ter pena. Elas não entendem nada de amor. Eu deveria ter raiva daqueles que me dizem: "- ponha Deus no seu coração, vá rezar”. Não tenho, sinto pena. Eles precisam tanto de Deus quanto um aleijado de muletas. Não conseguem caminhar sozinhos.

Não sei bem certo se é só ilusão

É cômodo jogar tudo na mão de Deus, se jogar no conformismo, se livrar de sua carga e jogar nas costas de outro, mesmo que esse outro seja um Deus. Eu sei que a carga compartilhada fica mais leve, mas há tarefas que precisam ser executadas sozinhas. Eu nunca gostei de trabalho de grupo mesmo. Desde pequena, aprendi a confiar em mim e na minha força de reação.Eles não compreendem aqueles que preferem fazer tudo sozinhos. Eles não compreendem, aquele difícil e solitário momento da decisão, quando só com suas forças, decide recomeçar, apesar do terrível cenário de destruição.

Se é você já perto ou se é intuição

Sempre afirmei ser um ser imperfeito, sou egoísta, não gosto de interferência na minha vida, imagina se aceitaria intromissão nos meus sentimentos! O que relato aqui, jamais discuto no mundo real. Não sou dona do amor absoluto, mas do meu amor eu entendo. Mais importante ainda, eu sei que ele está sempre comigo. Eu descobri a presença dele nos menores acontecimentos do dia a dia. Não aparece como um fantasma para me assombrar, para me dar força, conselhos. Eu tenho sentido, fortemente, a presença dele perto de mim. Ele está no vento que me acaricia, na água da chuva que molha meu rosto, no vôo do pássaro que me encanta, ele é o passarinho que me acorda todas as manhãs com seu canto delicado e amoroso. Ele pode ser a singela flor, que chama minha atenção, quase sufocada pelas ramas verdes. Pode estar no sorriso dos meus filhos. Ele está em cada nota das músicas que eu gosto. Ele está dentro de mim.

Longe daqui, longe de tudo, meus sonhos vão te buscar.

Pode ser pura ilusão, posso estar buscando zonas de escape, posso estar sonhando acordada. Quem sabe? A minha intuição diz que não. Tenho andado tão calma e feliz, como quando ele estava comigo. Quando ele está perto de mim, o mundo gira mais devagar, o relógio é apenas um detalhe e não um marcador das horas que me senti longe dele. Estão longe, distantes mesmo, os meus momentos de confusão, quando eu o acusava de ser um traidor, havia me prometido nunca ir embora, antes de mim. Como fiquei furiosa com ele! Eu sempre acreditei nele. Quando ele partiu e me deixou sozinha, me senti uma criança abandonada. Que agonia! Que momentos tenebrosos! Perdida na escuridão sei que ele tem me conduzido, pela mão, durante estes sete anos que nos separam fisicamente, em busca da salvação da minha alma, me levando em direção ao a luz, ao sol, ao aconchego dos seus braços, ao seu colo, que é meu lugar.

Volta prá mim, vem pro meu mundo, eu sempre vou te esperar.

Café?

quarta-feira, 11 de abril de 2012

a bailarina


Às vezes procuramos uma coisa e achamos outra. Acordei com vontade de ler poesia, levo a mão a estante e aleatoriamente minha mão cai em Clarice Lispector - se eu fosse eu. Imediatamente viajei para dentro de mim. O que eu faria se eu fosse eu? E por acaso eu não sou eu? Claro que não, eu sou um personagem e como tal, preciso seguir o roteiro. Como eu seria se conseguisse ser “eu” e não a Tania? Dei asas a minha imaginação e voei, mesmo com as asas cortadas.

Lembrei de mim criança, momento importante na minha vida, foi lá que começaram a me moldar, foi lá que começaram a escrever o meu papel no teatro da vida. Eu acabei por incorporar o personagem e atuar, quase à beira da perfeição. Algumas falas eu esquecia, mas improvisava e assim venho trazendo o personagem comigo e o representando dia após dia.

Nasci menina, gostava de ser menina, jamais pensei em ser um menino, principalmente por achar que todos eles eram um tanto tolos, para meu gosto. Eu amava a liberdade que eles tinham! Não concordava e ainda não concordo com as limitações impostas às meninas. Eu não conseguia ver nenhuma diferença tão fundamental entre os meninos e eu, a não ser o fato deles serem meninos. Porque eu precisava brincar com bonecas ou de casinha se eu preferia subir em árvores? Eu subia melhor que meu irmão. Nunca considerei justas essas regras.

Claro que eu era uma fonte constante de preocupação e desespero para minha mãe. Sempre que ela vinha com o aviso de que eu não poderia fazer determinada coisa, por ser menina, eu questionava o motivo. A resposta era sempre uma só :“Você é uma menina , não fica bem e não se discute mais esse assunto.” Grande resposta essa ! Não esclarecia nada e me deixava furiosa. Eram inúmeras as regras para as meninas, desde a maneira de sentar até pegar os talheres com elegância, entre outros absurdos. Para os meninos tudo era aceito. Como eu invejava aquela liberdade deles! Ao longo da vida percebi que as vantagens deles sobre as mulheres eram bem mais amplas do que eu imaginava.

E se eu fosse eu, como seria? Eu tinha vários sonhos! Todos eles para sonhar sozinha. Não queria compartilhar nem um deles. Eu aprendi que precisamos de uma certa dose de egoísmo para sobreviver. Tudo bem, sei que exagero muitas vezes.

Claro que nos meus sonhos, brincar de casinha ou de bonecas, não havia espaço. Eu achava terrível a vida que minha mãe levava, não queria aquilo para mim. Meu pai saia cedo para o trabalho, quando vinha almoçar, encontrava a casa limpa, comida na mesa, filhos limpos e comportados. Será que ele sabia o trabalho que ela passara para oferecer tudo aquilo a ele? Eu tinha pena dela, mas não colaborava me comportando como ela desejava. Não achava justo meu pai na rua, interagindo com outras pessoas e ela presa naquela rotina, sem nenhum tempo só para si mesma. Descobri mais uma injustiça contra as mulheres, trabalho escravo e em confinamento.

Eu sonhava, não poderia compartilhar com minha mãe. Ela não entenderia. Uma vez até tentei, ela me olhou espantada se questionando onde fora que errara tanto na minha criação. Eu disse a ela que queria ser bailarina, esse era meu sonho. Foi como se eu tivesse dito que meu sonho era trabalhar num prostíbulo Ela me disse para nunca mais repetir aquilo e que eu seria professora, esse sim, um serviço decente e apropriado para as mulheres, isso seu eu quisesse um dia trabalhar ou meu marido permitisse. Disse que achava improvável alguém querer casar comigo se eu não mudasse meu comportamento. Não me preocupei nem um pouco com a previsão dela. Marido não fazia parte dos meus sonhos. E eu pensando que fosse um sonho viável! Nunca mais compartilhei meus sonhos com ela.

Eu amava a dança. Amava a leveza, a liberdade de expressão, a delicadeza, a sensualidade e o poder de sedução. No palco, as bailarinas voavam, eu queria voar. Confesso que até hoje, quando assisto um espetáculo de dança, sinto uma certa inveja e uma saudade do que eu poderia ter sido e não fui. Quando meu voo foi cortado, como sou sobrevivente, me voltei para a música. Eu ouvia a música e em imaginação, eu dançava. Até hoje faço isso.

Logo após essa decepção, eu desejei ser homem! Foi essa a única vez que desejei ser um homem. Eu queria ser um marinheiro. Na verdade um fuzileiro naval , um "mariner". A hipótese de uma guerra não me preocupava, era algo distante, para mim. Viajar pelo mundo a fora, parando de porto em porto, conhecendo lugares exóticos, era meu maior sonho. Era sinal de liberdade. Esse sonho era influência do cinema americano. Não pensava que eles não eram tão livres como eu imaginava, mas eu fantasiava. Singrar os mares, soltar as amarras, era tudo o que queria. Nem pensava que eu já havia viajado de navio e vomitara durante todo o percurso, fora o enjoo constante. Nos sonhos o mundo é perfeito. Diante da impossibilidade de me transformar num homem, acabei desistindo desse sonho também. Ainda me vejo, ao olhar o mar, partindo para o desconhecido em busca de liberdade.

Como ser eu mesma? Impossível ! Eu cresci, me adaptei, me tornei professora, com minha mãe queria, me apaixonei irremediavelmente, casei, tive filhos e fui feliz, mesmo não sendo eu mesma. Hoje tenho a liberdade de ser eu mesma, mas tenho responsabilidades e essas continuam me impedindo de ser eu mesma. Eu fui feliz sendo a outra então é melhor deixar a "eu mesma" quieta, no canto do imaginário. Lá, ela pode ser livre. Lá ela não é responsável por ninguém, apenas livre. Não vou perdoar a Clarice!

"Cada um vive atrás das grades que carrega consigo." (Franz Kafka)


Café?


domingo, 18 de dezembro de 2011

rompendo paradigmas





Queria ter postado algo quando atingi os dez mil visitantes, mas andava envolvida demais comigo mesma. Não tem dois anos ainda que  este  blog  nasceu despretensioso, apenas um local para eu largar as pedras que carregava nas costas. Larguei as pedras pelo caminho, mas ganhei uma responsabilidade . 
Hoje acordei tão feliz com o canto dos pássaros madrugadores! Fui para a sacada observar o dia que nascia manso e luminoso. É inacreditável a beleza do horizonte , preguiçosamente acordando, apoiado no mar, quando o sol começa a aparecer. Senti-me iluminada por dentro. Estava tão feliz, naquele momento, que chegou a me dar medo! Ser feliz hoje em dia depende de tantos fatores ! Com medo de ser feliz, mesmo por alguns momentos, me perdi nos meus pensamentos. Melhor, mergulhei neles.

Essa sociedade bizarra, onde vivemos, faz tantas cobranças que nos deixa com pouco espaço. Não há muitas opções, ou você se enquadra ou é considerado marginal. Essa luta inglória de tentarmos sermos nós mesmos e ao mesmo tempo não nos diferenciar dos demais, nos esgota. Queremos ser nós mesmos mas, ao mesmo tempo, precisamos atender aos princípios que foram pré estabelecidos sei lá por quem, igreja , sociedade, família, Estado ou todos juntos.
 Sem falar no  nosso próprio freio de mão, sempre somos conscientes do momento que aceleramos e os riscos inerentes a esse gesto. Deveríamos arriscar mais, romper paradigmas .

Pensei nas mulheres. Elas nasceram para casar, terem filhos e criarem esses filhos.  Diante dessa predestinação, as que não conseguem casar, recebem uma marca – perdedoras. Desperdiçam o resto de suas vidas acumulando frustrações e sentindo se diminuídas. Um péssimo casamento é melhor que nenhum casamento. A qualidade de vida, a felicidade, a realização pessoal, a paz de espírito não importam.  Importante é ter a marca do dono – senhora fulana de tal.

As que não  são adeptas ao casamento, por questão de opção de vida- são as disponíveis e essa palavra não é um elogio.  São vistas como, no mínimo , estranhas, ou coisa pior. A sociedade bizarra ainda não amadureceu o suficiente para entender essas mulheres.  Um dia ainda chegaremos lá.  Há bem poucos anos atrás, uma mulher separada era muito mal vista, hoje, não existe mais esse preconceito.  Quantas ficaram presas a casamentos infelizes para protegerem os filhos do estigma  de serem frutos de um lar desfeito? Nem vale a pena falar sobre a dependência econômica, seria estender demais o assunto e, esse não é meu objetivo.

Filhos. Ah os filhos ! A noiva mal sai do altar e começam as tias a cobrarem filhos.  Isso nos casamentos convencionais, atualmente, é cada vez mais comum, os filhos virem antes do casamento. Filhos não desejados mas aceitos. Como ficam as mulheres que não querem filhos? Não querer filhos é um crime grave, afinal as mulheres nasceram para procriar e assegurar  a sobrevivência da espécie. Os modelos de comportamento já estão estabelecidos, ninguém tem o direito de romper os paradigmas.

Atualmente há um patrulhamento ideológico muito bem disfarçado. As pessoas são obrigadas a aceitarem as regras ou serem criminalizadas ou discriminadas. Experimentem e observem as reações escandalizadas, se disserem em um grupo, que não seja o seu , que não gosta de crianças, cachorros, nordestinos, homossexuais ou afros.  Diga que adora um sapato de couro de jacaré, um lindo casaco de pele natural.Quem tiver a ousadia para tal será marcado a fogo. Não gostar de manga ou sapoti( eu detesto essa fruta enjoativa), não significa necessariamente que a pessoa vai sair serrando e exterminando todas as árvores que produzem essas frutas. Significa apenas que não gosta ! E daí? Somos obrigados a gostar de tudo o que os outros gostam?

Outro ponto nevrálgico é a família! A família é sagrada, é nosso porto seguro, nosso refúgio. Ela nos fortalece e nos dá segurança e o rumo certo. Outra mentira. Deveria ser assim mas nem sempre é. Há famílias que são responsáveis diretas, pelas desgraças que acontecem com algum dos membros. Experimente dizer que não gosta do seu pai , da sua mãe ou de algum irmão ! Você será olhado como uma pessoa estranha ou louca.

 Na minha mão há cinco dedos, nenhum é igual ao outro, eu prefiro o menorzinho, o mindinho ( por motivo fútil e não funcional, ele é o mais bonito).  Devo cortar todos os outros? Claro que não, todos  possuem uma função específica e são necessários para o perfeito funcionamento da mão. Se eu perder um dedo minha mão para de ter utilidade? Não, simplesmente vou tentar me adaptar a fazer tudo com quatro dedos e não mais cinco. Se eu perder a mão, vou continuar vivendo do mesmo jeito. Assim é com a família! O que mantém as pessoas da família unidas não é o famoso “laço de sangue”,  é o respeito e o amor. Quando não há respeito ou amor, não há laço que segure a união. Igualzinho  a  qualquer grupo social. Outro paradigma que precisa ser rompido pra não acrescentar o sentimento de culpa naqueles que não conseguem se relacionar bem dentro de suas famílias. É o dissidente o culpado ou a família que não o respeitou e nem o amou  o suficiente para aceitá-lo como diferente ?

Todas essas reflexões surgiram de uma conversa com uma amiga. Ela é financeiramente bem resolvida, não quer casar, não gosta de crianças e nem de cachorros. Não é lésbica, tem seus namorados, mas até hoje, nenhum despertou nela o desejo de dividir sua vida. Ela está errada?  Claro que não! Ela é dona de seu destino. No entanto, essa sua atitude ou filosofia de vida,está criando um enorme problema , a mãe e as irmãs a criticam. Estranho é o comportamento das irmãs, pois nenhuma delas possui sequer um casamento razoável. Gostam da condição de casadas, apenas isso as mantém presas num lar infeliz. O que essa minha amiga fez? O que qualquer pessoa sensata faria, depois de tentar se fazer entender, se afastou da família. Vai morrer chorando neste Natal ou entrar em depressão? Não, vai partir num cruzeiro com outras mulheres que pensam como ela. Pretende ser divertir muito e está aberta a algum relacionamento, se surgir. As irmãs, tenho certeza, com a vidinha medíocre que levam, passarão o Natal criticando a irmã.

Há conceitos tão antigos que precisam ser mudados pois a família não é mais a mesma. As mudanças na sociedade, na economia, entre outras tantas, obrigou a formação de novas famílias que continuam regidas, ainda, por velhos tabus. Gostar mais do pai do que da mãe não é crime algum, significa apenas que há mais afinidade com o pai. Respeitar os dois é essencial, questão apenas de hierarquia, de educação. Normas são necessárias em qualquer grupo social.Não concorda com as normas dos pais ? Basta ter paciência e esperar seu momento de provar que eles estava errados. Poderá ocorrer uma grande surpresa, você descobrir que eles estavam certos o tempo todo. Pais erram e muito, afinal, eles são apenas seres humanos e não deuses. Como cobrar perfeição? Como eu disse a minha amiga, ela não deve se sentir culpada de nada. Não ocorreu um ato de desamor, pelo contrário, ela, em respeito ao pensamento da família, querendo manter sua posição, apenas se afastou. Quem errou foi a família que não a respeitou como ser independente do grupo.

Aos irmãos se aplicam as mesmas regras dos dedos das mãos. Todos criados na mesma casa e todos diferentes. Quando os pais conseguem ensinar respeito, a convivência é mais fácil. Sem o respeito, os jovens lobos começam a querer disputar território e o mais forte se impõe aos outros. Quem disse que os mais fracos aceitam a liderança do mais forte? Eles se unem, apenas por interesse, para combaterem o outro. E a figura do "filho preferido"? Em quase todas as famílias existe esse personagem. Coitado ! De duas uma, ou ele usa esse título e usufrui de todas as vantagens que esse "favoritismo" lhe oferece ou é obrigado a conviver, para sempre, com o ciúmes, mesmo que velado, dos outros irmãos. Precisará provar, o tempo todo, porque é o favorito. Cansativo isso! O mais trágico disso tudo é que esse favoritismo significa apenas, que tem mais afinidade com o pai ou com a mãe. Experimenta dizer que não gosta de um irmão ! Será olhado com muita estranheza.

Um irmão poderá ser um amigo , mas não necessariamente. Amigos são a sua segunda família, aquela que você monta, sem imposição, sem cobranças. O amigo você o atrai pela afinidade. Há diferenças fundamentais entre amigos, colegas e conhecidos, eu falo sobre amigo. O irmão não, sem chance de escolher, é igual a colega. Vocês ficam juntos por algum tempo, por necessidade, poucos, no entanto, se tornam amigos. As irmãs da minha amiga, continuaram, ao longo da vida, apenas irmãs, não amigas. Devemos ousar e romper esses paradigmas, sem culpa, sem remorso. Como são complicadas e delicadas, as relações familiares onde você é obrigada a gostar de alguém que não tem a menor afinidade com você, além de não ter respeito.

Eu não estou preocupada com minha amiga, estou muito preocupada com a mãe e as irmãs dela. Me atrevo a dizer que elas gostariam muito de ter a coragem da irmã, viver a vida como elas desejavam, mas lhes faltou coragem para enfrentar o desafio, logo, é mais fácil criticar aquela que ousou ser feliz, apesar da  oposição da família. Penso que devemos sempre ousar, arriscar, é bem melhor do que ficar infeliz  uma vida inteira sem saber se daria ou não certo ter tido a coragem de mudar.

Café?


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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

a dança das folhas



Chove lá fora, estaria tudo cinza se não fossem as folhas secas e avermelhadas das amendoeiras, executando sua dança, regidas pelo vento, em alegres revoadas. Dias chuvosos e enevoados são tristonhos. Trazem para a alma uma certa nostalgia, uma saudade dos dias ensolarados.

No vidro embaçado, desenho corações entrelaçados, dentro deles escrevo iniciais. É tão fácil apagá-los na vidraça ! Com um passar de mão eles somem. Recomeço a desenhar, tentando fazê-los o mais perfeito possível. Floreio as letras, me afasto, examino minha obra de arte, me dou por satisfeita e fico apreciando. O meu coração se enternece. A vida passa, como um filme mudo e em preto e branco.

Meus olhos inquietos passeiam pela vidraça sem perder o ballet das folhas. A chuva recomeça a cair mansinha, mas intensa, criando uma cortina de voal na minha frente, ofuscando a dança das folhas avermelhadas. Tenho vontade de abrir essa cortina com minhas mãos para poder continuar a assistir ao espetáculo.

Lá fora está frio, dentro do meu peito, a saudade dos meus dias ensolarados se instala. Com ela vem o frio e a inquietude. Lá fora, a chuva parece chorar. Aquele choro doído da saudade. As folhas não dançam mais. Elas acenam, dando adeus e vão se dispersando, vão sumindo, levadas pelo vento. Na minha frente fica o vazio do cinza. Não gosto de cinza. Adoro o colorido das telas de Gauguin . Saudade das cores intensas, dos vermelhos , dos amarelos, dos verdes e dos violetas.

Fico parada, o olhar perdido, na névoa acinzentada. As folhas vermelhas desapareceram. Chopin é uma boa pedida para dias de chuva, mas ele me deixa muito triste. Penso numa longínqua praça... Havia uma chuva intensa, eu pisava nas folhas coloridas do outono, ouvindo o estalar delas, reclamando a cada passo que eu dava. Eu me deliciava com o ballet dos guarda chuvas na minha frente, eram de todas as cores, mas predominavam os pretos. Detesto guarda chuva preto e não gosto dessa cor. Pareciam mensageiros alados de maus presságios. Todos eles deveriam ter cores vibrantes. Naquele dia, lá ao longe, eu era tão jovem! Tinha tantos sonhos.

Nunca deixem que lhes digam que não vale à pena acreditar nos nossos sonhos ou que nossos sonhos nunca se realizarão. Não deixem que lhes digam que sonhar acordada não vale, não é sonhar é apenas exagero da imaginação, uma fantasia, uma alucinação. Os sonhos acontecem. Eles se realizam.

Naquele dia, lá longe, eu caminhava e ouvia o canto da chuva, o canto da terra e sonhava. Todos os elementos da terra se comunicavam comigo. Estava em perfeita comunhão com o universo. A minha vida era um filme colorido, com direito a trilha sonora. A música estava na minha cabeça.

Eu me projetava num futuro todo construído no meu sonho e o vivenciava, ali, enquanto atravessava a praça, de pés descalço, os sapatos molhados me incomodavam, quebrando todas as regras, eu os havia tirado. Naquele dia, naquele momento, eu era livre para decidir o que fazer. Eu era dona do mundo, dona do meu mundo, como a rosa do Pequeno Príncipe. Eu não era uma rosa vaidosa, nem arrumei minhas pétalas ou fiz exigências, me bastava ser feliz. Aquele meu sonho foi uma visão do meu futuro. Aquele exato momento, eu vivi duas vezes. Uma em sonho e mais tarde na vida real. Por esse motivo, dou meu testemunho de que os sonhos acontecem! Nunca permita a ninguém, abafar seus sonhos, impedir seus voos, solo ou não. Naquele dia, me vi caminhando, de mãos dadas, com o único homem que amei na minha vida. Ele existia, hoje, embora em outro plano, ele continua comigo. Eu o vejo em todos os lugares onde há beleza, onde há suavidade, onde há alegria. Eu o encontro até nas gotas de água da chuva. Eu o vejo na vidraça embaçada. Ele mora dentro de mim.

Hoje, na janela, meus sentimentos passaram pelas quatro estações. A alegria do brotar das folhas novas da primavera, o calor do verão, a doce companhia e a quietude do outono e a solidão do inverno.

Estava parada, olhando o nada cinzento lá fora e divagando, repentinamente, minha atenção foi despertada pela presença de um passarinho no peitoral da janela. Ele estava todo molhado e logo o reconheci. É mesmo pássaro, que todas as manhãs, lá pelas seis horas, canta na minha sacada.

Nunca entendi, mas em vários momentos da minha vida, não sei se é o mesmo, mas é sempre o mesmo tipo, aparece um pássaro. Ele é bem pequeno e nas cores marrom e amarelo. Tem um canto tão delicado! Não vou questionar o motivo dele não ter procurado abrigo da chuva. Agradeci a presença dele, que logo voou e ,desapareceu, como sempre faz quando vem me ver.

A noite caiu, tudo escureceu lá fora, agora só vejo janelas iluminadas, como se fossem olhos de animais me espiando. Fechei a cortina. A vida continua.

Café?